Tomei conhecimento que meu amigo Luiz Otávio, editor do GLN, noticiou fato sobre o ex-prefeito de Leopoldina, José Roberto de Oliveira, no jornalístico de maior audiência da cidade, o Jornal Leopoldinense no Ar, apresentado pela Rádio Jornal AM de segunda à sexta, às oito horas da manhã. Neste dia, não pude ouvir o programa (o que faço freqüentemente) devido a compromissos de trabalho. Soube, por comentários, que naquela tarde a emissora recebeu uma visita nada cordial, questionando em tom ameaçador a divulgação da matéria. Fiquei perplexo com esta reação, porém, surpreso. Surpreso, porque acreditava na evolução, na maturidade que poderia ter chegado, até mesmo pela longa trajetória na vida pública do ex-prefeito. Este comportamento nada democrático me decepcionou profundamente. Gostaria de dedicar algumas linhas a considerações, não sobre o personagem, mas sobre o contexto.
A situação não é nova, não é recente. Já no final da década de 1990 a ANJ – Associação Nacional de Jornais afirmava em seu relatório anual que "no momento em que o Brasil vive um regime democrático de ampla liberdade de imprensa, aumentam os ataques a jornalistas e órgãos de comunicação e impera a impunidade, num sistema em que a Polícia não apura e a Justiça não pune, caracterizando-se tal situação como intolerável e que exige providências urgentes por parte do Estado". Em 2003 a BBC Brasil revelava que o Brasil caira 17 posições no ranking de Liberdade de Imprensa, publicado pela organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) e que neste ano avaliou 166 países. A queda da 54ª para a 71ª posição se deveu principalmente à inclusão de 27 países na classificação, mas o fato de a maioria deles ter entrado na frente do Brasil mostra que, segundo o RSF, o país está longe de ser considerado um lugar seguro para o trabalho jornalístico. Segundo Regis Bourgeat, um dos responsáveis por este relatório, jornalistas são ameaçados e agredidos durante o trabalho, mas ressalta que a maior parte dessas coações é feita contra jornalistas de veículos menores, raramente afeta profissionais da grande imprensa. "A situação no Brasil é ambígua: a grande imprensa trabalha sem repressão formal. O problema é na imprensa local, que é fundamental para a democracia. Seja como for, o Brasil continua atrás de países como Trinidad Tobago, Bolívia, Congo e Tanzânia. O relatório do RSF é feito com base nos resultados de questionários respondidos por jornalistas, pesquisadores e juristas. Chegando em 2006, o Relatório da Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ, sob o título "Violência e Liberdade de Imprensa no Brasil", realizado pela Comissão Nacional de Direitos Humanos da FENAJ, revela que não só para a nossa sociedade, mas também para a comunidade internacional, o jornalismo praticado no Brasil ainda está marcado a ferro e fogo por desmandos e atos que buscam sufocar o trabalho dos profissionais da mídia, manchando o ainda recente processo de redemocratização em nosso território. Em 2006, foram coletadas informações sobre 68 casos de violência e cerceamento à liberdade de imprensa vividos por profissionais da área em diversos Estados de todas as regiões brasileiras. A grande maioria das vítimas é formada por jornalistas. Estes casos foram analisados sobre diversos aspectos, no intuito de diagnosticar os meandros que envolvem o cenário de violência contra a imprensa no País. Além desses 68, outros seis casos sobre coberturas de risco, arquivamento de processo e julgamentos também foram incluídos no relatório a título informativo, mas não foram considerados na análise. Ao contrário do ano anterior, percebe-se que desta vez muitos casos foram mais amplamente divulgados, ao menos nas páginas especializadas da Internet, destinadas ao público formado por profissionais da imprensa. Mas essa leve melhora ainda não é suficiente. "É necessário que os profissionais denunciem cada vez mais, o que percebe-se que ainda não é um hábito no Brasil. Enquanto isso não acontecer, teremos que trabalhar com uma amostragem da realidade brasileira", cita o relatório. O levantamento revela também semelhanças entre a quantidade e o perfil dos casos de violência e cerceamento da liberdade de imprensa registrados em 2006 e 2005, quando foram catalogadas 67 ocorrências. Assim como em 2005, em 2006 a maioria foi de agressões físicas e verbais (21 casos), mostrando que o uso da violência é uma constante para impedir o trabalho dos jornalistas. Da mesma forma, também ficaram em segundo lugar os casos de censura e assédio judicial, 16 no total, que neste novo levantamento vêm reunidos em uma só categoria, já que em muitas vezes agregam características comuns. O recurso à Justiça tem sido uma estratégia freqüentemente usada para intimidar o trabalho da imprensa, principalmente em anos eleitorais, como em 2006, quando grande parte dos casos envolveu como autores candidatos e coligações políticas interessadas em impedir a divulgação de denúncias para seus eleitorados. E muitas vezes essas pessoas que deveriam garantir o direito constitucional de acesso à informação saem vencedores na queda de braço pela divulgação de notícias. Agentes do mundo político e do serviço público prosseguem sendo maioria entre os autores dos casos catalogados no relatório 2006, assim como ocorreu em 2005. As formas de expressão dessa violência que busca calar a boca da imprensa podem atingir facetas extremas. Em 2006, foram quatro casos de assassinatos de profissionais da área, o dobro do número registrado no ano anterior, e oito de prisão e tortura, quatro vezes mais que o enunciado no relatório passado. O Brasil é um País que cada vez mais se sedimenta como sendo perigoso para o trabalho da imprensa, o que é lamentável, vergonhoso e inadmissível numa sociedade democrática. E em defesa da democracia, da liberdade de imprensa, devotaria horas e horas escrevendo, argumentando, mas não o farei para não cansar os leitores deste espaço que se tornou leitura inevitável, dentro de um contexto em que precisamos nos manter bem informados. Meu caro Luiz Otávio, fundamentado em conceitos e números oficiais como os explicitados acima, é que manifesto minha incondicional solidariedade e apoio à sua atuação como digno representante da imprensa brasileira, orgulhosamente leopoldinense. Não é mais aceitável a truculência de alguns, truculência esta experimentada amargamente por mim e minha família em anos recentes, onde tive minha casa invadida pela polícia da época, fui perseguido a ponto de numa das reuniões da Câmara de Vereadores de Leopoldina ouvir em minha defesa que "nem mesmo nos anos mais duros do Regime Militar houve em nossa cidade uma perseguição tão implacável quanto a que eu estava sofrendo". Para quem não sabe, além de radialista, tive a oportunidade de editar o jornal O VIGILANTE, que por alguns anos (bem poucos, é verdade) conseguiu enfrentar esta mesma truculência que, pensava eu, havia se convertido em bom senso, equilíbrio e maturidade. Quando um órgão sério como o GLN publica notícias, emite seus editoriais, deve ser tratado com respeito. Mesmo se errar, e todos somos passíveis de erro, ninguém pode querer calar a liberdade de imprensa no grito, à base de ameaças, agressões ou intimidações. Fica feio para quem assim se comporta. Fica muito feio, pois o que acontece até mesmo em Leopoldina neste momento, quase que simultaneamente é destaque no mundo inteiro, pela Internet, através de veículos como o portal leopoldinense on-line, outra conquista democrática que nos brinda constantemente com a possibilidade de interagirmos com o fato. Parabéns, meu amigo Luiz Otávio, assim como a toda sua equipe, formada pelos seus filhos, com apoio de sua família. A luta não seria fácil, tenho certeza que você melhor que ninguém já sabia. Mas, não se preocupe. Você não está só. Estamos com você, incondicionalmente. Estamos com a Democracia.
Um abraço do seu fraterno amigo,
Júlio Cesar Martins.
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